O fogo amigo do PT contra Janja

O PT, que se dividia em várias tendências de esquerda, hoje vive um bipartidarismo interno: há os que apoiam Janja e os que torcem o nariz para ela. Quem apoia Janja: o maridão Lula. Quem torce o nariz para Janja: Franklin Martins, Paulo Okamotto, Luiz Dulci, Aloizio Mercadante, Gleisi Hoffmann e Rui Costa. Ou seja, Janja conta com larga maioria de apoiadores dentro do PT.

Janja vive no noticiário por causa também do fogo amigo. Soube-se que, honrando a tradição petista com o dinheiro público, ela comprou sofá de 65 mil e cama de 42 mil para o Palácio do Planalto. Divulgou-se que a primeira-dama queria uma mesa de 200 mil reais, mas a compra foi vetada por Rui Costa, porque aí pegaria muito mal. Publicou-se que Janja entrou numa loja da marca italiana Ermenegildo Zegna, em Lisboa, para comprar uma gravata de 900 reais para Lula.

A primeira-dama está tão presente no noticiário — eu mesmo já tratei dela uma vez —, que um amigo meu jura que a viu no Shopping Iguatemi, aqui em São Paulo, entrando na loja da Bottega Veneta, uma marca de luxo igualmente italiana como a Ermenegildo Zegna, só que de bolsas femininas. Eu disse ao meu amigo que ele certamente estava enganado. Era dia de semana e ela deveria estar dando expediente no Palácio do Planalto.

Não que ache absurdo que Janja use acessórios de grife ou tente melhorar o guarda-roupa de Lula. Se não há dinheiro público envolvido, sou de opinião de que todo mundo de classe média, já que pode, tem o direito de ostentar um padrão de vida acima do necessário. Afinal de contas, defina-se necessário. A vida precisa de alguma graça e parte dessa graça está em fazer compras legais, ainda que você seja de esquerda. Dá para fazer umas comprinhas antes que a revolução acabe com os shoppings.

Quem aposta em Janja enxerga nela um misto de Evita com Isabelita Perón — a continuadora do lulismo, tanto simbólica como objetivamente, assim como foram as respectivas mulheres de Juan Domingo Perón para o peronismo. Como Lula não deixa ninguém do PT crescer à sua sombra, — e, quando deixou, deu em Dilma Rousseff –, a solução doméstica até faz sentido. Só que ele tem um passado de lutas e Janja, apenas um passado de compras.

Não é problema insuperável, tanto que ela já trata de incrementar politicamente a sua biografia, dando pitacos em assuntos de Estado e afastando do círculo de Lula as pessoas que ela julga que lhe podem fazer sombra. Natural, portanto, que a primeira-dama atraia ódios internos neste momento, e que eles se manifestem no fogo amigo de notícias de jornais que a pintam como frívola e metida.

Para quem está de fora, é divertido assistir a colunistas petistas antijanjistas serem xingados pela outra ala do partido em que militam. Mas, se tudo der certo para Janja, os que hoje a atacam irão venerá-la amanhã. E eles poderão dizer que são imparciais porque falaram do sofá, da cama, da mesa e da gravata.

Mario Sabino

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